Luz acesa, me espera no portão

 


Por muitos anos, preparei a casa, varri os tapetes colocando o lixo realmente pra fora, ajeitava os quadros por mais vezes do que o necessário, sentava na janela, cozinhava a paciência em banho maria. Tudo em mim te esperava, embora a certeza de sua chegada nunca tenha sido avassaladora porque ter fé em mim mesma nunca fui algo totalitário. Mas chegou. Chegou numa roupa que jamais fui capaz de imaginar, com trejeitos que eu não podia escolher para amar porque não seria capaz de organizar tanto amor, tanto sentimento. Há alguns dias estava em nossa cozinha e caí aos prantos de dor, como se o nosso gás estivesse vazando, mas nenhuma boca aberta. E você sussurrou, meio sem entender: mas eu sou como você queria. Sim, muito melhor, e também por isso dói. Hoje, segurando sua mão, amadureci porque atravessei um abismo sem aviso prévio, numa aceleração impensável, não sei onde vamos parar e quis te jogar janela abaixo, do vigésimo sexto andar, como se você fosse cruel, como se toda minha compaixão, apreço, cuidado, carinho, passo atrás, muitos passos atrás tivessem me traído. Mas você permanece invencível. Roupa bonita. Profundidade inalcançável. A minha segurança. Não sei como vamos cair, nem se você me perdoa por não te alcançar por mais que eu corra. Mas a casa ainda é nossa… e ela sempre foi e será sua.

Comentários