Existência

Quando sento para ler sobre tudo que já escrevi, sinto a mesa entrando no meu tórax, sinto a madeira cortando cada plano corporal em mim, sinto um universo pesando contra minha existência e tudo isso porque é sempre igual, vários detalhes que parecem únicos porque doem de formas inimagináveis de doerem em outros momentos já aconteceram. Por que tudo em mim é tão repetitivo e cansativo? O que me falta? 
Cheguei a um ponto de exaustão absurdo onde considero abandonar tudo que eu sempre quis, e nem isso é novidade, pois já fiz várias vezes. Abandono porque tenho medo de ser abandonada, fujo porque tenho medo de ser a última a sair. Em tudo. E em todos. 
Pela milésima vez, parei de comer e de dormir, então tento lembrar como entrei nisso e quando respondo sei que é mentira. Sei que é mentira porque, de alguma forma, o começo disso tudo está muito antes do início aparente.
É terrível a maneira como pego minha obsessão e mudo ela de lugar na mesma estante e tenho conhecimento disso. É terrível a sensação de que vou ter um infarto porque não consigo ir comprar um sorvete enquanto espero alguma reunião que não depende de mim, por exemplo. Dói em mim que outras pessoas possam ter o direito de decidir pra onde vai a minha vida ou que horas podem chegar ou sair dela. Dói, me rasga, fico dizendo que não consigo aceitar não ter o controle, mas eu tenho que aceitar porque não há opção e bem neste ponto entra outro ponto imensamente importante e doloroso: querer ter o controle de tudo me faz parecer apenas mais burra... Porque eu nunca vou ter. Então, o que estou esperando para mudar finalmente? São uns dez anos, literalmente, sentindo as mesmas coisas repetidamente e mudando a figura da dor.
Como eu posso em um dia materializar todos os meus medos, dispneias, insônia e falta de apetite em um conjunto de moléculas e no outro dia transferir para outro conjunto? Vamos, eu sei que eu sei pensar, eu sei que não sou tão burra quanto acho que sou. Vamos, pise no chão, você sempre soube que o problema nunca foi alguém além de você. 
Eu te dou a chance de respirar normalmente, segure na mão de quem dobrou as vísceras inúmeras vezes para você estar onde sempre quis estar, não abandone os locais, pare de abandonar as pessoas e seja persistente, continue tentando respirar, não se entregue, não desista.
Use a lógica e desenhe o mapa de saída desse pesadelo de tantos meses infinitos. Anderson disse: não cave mais pra baixo, ele também disse que o ato de pedir ajuda é algo imensamente maior do que qualquer coisa que esteja acontecendo e ele está certo porque provavelmente eu pensaria nisso em momentos saudáveis. A ajuda foi pedida e também foi dada. A boia está na mão e apesar de ainda ter água sendo engolida, a areia no chão é uma realidade visível.
Começaremos, definitivamente, a nossa melhor versão. Com alguém ou sem. E esse "sem" pesa e arde e sinto mesas entrando e tetos caindo, mas isso não depende de mim e eu tenho que, de uma vez por todas, ir comprar um sorvete. 

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