Ponto de Donatti

A primeira vez que te vi, não queria acreditar que você estava de cinza porque parecia uma armadilha, então não te olhei muito no desenvolver da noite e resultou em você me perguntar porque eu te olhava tão pouco nos olhos. O que eu ia dizer? Que era doida? Será que sou doida mesmo, meu Deus? Vixe! Você começou com assuntos que pareciam grades caindo ao redor de mim para me prender em seu mundo e comecei a ficar sufocada de sensações maravilhosas de onde também quis fugir, mas lembrei que aceitei sair com você porque eu tinha acabado de fugir e parei, fiquei quieta.
Pensei que você não ia me beijar no meio do cinema e comecei a imaginar que meu cabelo devia estar horroroso ou meu rosto. Meu vestido! Era isso, então. O conjunto dos três. Eu devia ter cortado meu cabelo antes do encontro, eu sabia. Também tinham minhas unhas que apesar do marrom ser maravilhoso, estava saindo. Quem vai para um primeiro encontro com o esmalte saindo? Era tudo isso. Pensei que podia me levantar no meio do filme e ir embora porque você era educado demais para me mandar ir embora. Mentira, nem pensei nisso lá, pensei só agora. Aí você alisou meu braço e perguntou se isso me incomodava. Então eu não era a única insegura ali? Mesmo? Mesmo, mesmo? Como assim eu ia me incomodar? Tava doido!?! Aí me beijou. Ali. Ali me beijou.
Todos os primeiros beijos com as outras pessoas foram os mais estranhos da série delas. Inclusive da pessoa que mais bem me fez em terra: foi tão estranho que pensei que nada mais era tão estranho quanto aquilo. Inclusive da última pessoa que mais me fez mal: na verdade o primeiro beijo eu nem queria, o último eu só sentia que ele não queria, ou seja, série de tragédias em forma de beijos! Mas o teu primeiro beijo foi um ciclone tranquilo no paraíso. E todos os outros foram como se fosse o primeiro.
Hoje, eu acho que vim aqui te dizer tchau. Paixão de férias, você sabe. Isso aqui agora sou eu dizendo a mim mesma "deixa ele ir embora porque acontecimentos de férias ficam nas férias e só, você (no caso, eu) sabe (devo saber)". É claro que eu queria te levar para agosto, setembro e meus noventa e seis anos, mas como? Como eu vou te dizer isso sem parecer doida?
Sabe, eu tenho que te pedir desculpas pelos últimos seres humanos que passaram por aqui: fui tão nua e crua com eles e eles tão pouco, eles tão nada que não quero ser para mais alguém e é claro que eu sei que você não é só "mais alguém" (mentira, não sei, talvez seja), mas tenho vergonha, ainda me sinto escancarada.
Sabe, acho que fomos rápido demais. Olha, eu sei que se você for menos, vai dizer que rápida demais fui eu. Eu. Eu e eu. Fui. Sei lá, vai que eu morresse, então para que desacelerar? Por que ser difícil para mim mesma quando, no mundo, quem mais pode facilitar para mim sou eu? Talvez se eu não tivesse pisado tão forte, você fosse querer passear mais. Mas, sinceramente? Eu nem sei se você quer ou não.
Outra coisa: eu sou maluca. Você me dá boa noite e dorme dez minutos depois. Isso me corta. Sei que você tem família. Aliás, sei lá. Quem é você mesmo? Venho de uma série de desequilíbrios mentais sustentados (e equilíbrios se sustentam?) em uma insegurança monstruosa que fala mais alto que minha voz e falei que não ia deixar isso acontecer com você nem para você. Claro, nem te conheço. Mas se eu fosse te conhecer mais, quis dizer. Era uma promessa, eu acho. Ia provavelmente precisar de remédios, mas tudo bem porque você ama psiquiatria, assim como eu, apesar de ir para medicina de emergência, o que me deixa sem ar e sem chão, querendo cair na sua cama.
Minha cabeça inventou um papel de um ser humano, o qual eu ia desejar, baseado em você antes de te conhecer. Mas sabe o que vou fazer agora? Ir embora porque não tenho coragem para nada depois de uma série de coragens ferradas. Você não tem culpa, mas queria dizer que nem eu. Amei as férias como as crianças devem amar. Amei cada segundo com você das 39 horas que passamos juntos. Para expor uma noção, quando dormi ao seu lado, sonhei que estava deitada ao seu lado, então posso dizer que, sim, vivi cada pedaço de verdade. Nem preciso dizer que jamais vou esquecer porque minha mente nunca esquece nada. Nunca. Nada. Acho que tenho que apagar nosso histórico para não ficar relendo e chorando. Chorando pelo que, só Jesus pode dizer.
E, por último, todavia provavelmente o fato mais marcante: você me salvou de alguém que me agrediu mentalmente. Obrigada. Deve ser por isso que toda vida que te olho tento lembrar com qual super herói você parece. Todo pequeno, desenhado e com miopia (é miopia?) e de vez em quando veste pijaminha para salvar vidas. Você salvou minha cabeça. Acho que agora é tchau. Tchau...

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