Eu no carnaval

Acordei seis horas da manhã num sábado de carnaval, não que faça diferença porque eu nunca soube mesmo o que é carnaval. Acordei e tinha um caminhão enguiçado da minha orofaringe ao esterno. Acordei e pensei que, puta que pariu, não é possível que eu tenha acordado assim mais uma vez por causa de alguém. Que puta que pariu mesmo. 
É sempre diferente porque se fosse igual eu não ia estar sentindo nada disso. Mas é sempre igual. Ficar morrendo quando acorda e quando vai dormir e toda hora. Sempre errei com as pessoas. Elas chegavam, negociavam comigo por tempos até me ganhar e eu fazia alguma coisa horrorosa e depois queria perdão. Você chegou, negociou, me ganhou, não fiz nada e você foi embora. 
Você é ridículo. Uma criança mimada que não queria o que disse que queria, mas pediu. Pela capa. Pela banalidade de apenas pedir. E teve. E quebrou. E deixou. Como algum brinquedo que minha irmã quebra e joga em qualquer lugar porque nos três primeiros minutos é interessante, mas, depois, ela já sabe o que é e se perde. E acaba. Mas você não sabe o que sou. Quer dizer, sabe bastante e esse é um dos motivos de eu ter dormido tão ruim e pouco: Você soube bastante do que eu era e não quis. Conforto básico é saber que você não soube tudo, que apesar de ter me visto nua de várias formas, não usou nenhum bisturi para me ver completamente. Faltou pouco, mas Deus sabe o que faz e eu, mesmo parecendo não saber, na maior parte do tempo sei também. 
Nunca fui tão clara, objetiva e sincera com alguém. Nunca fui nada disso que fui para você porque existe uma trava fisiológica em mim. Com você, ela parou de funcionar e enquanto eu me rebolava no que a humanidade pode oferecer de melhor (eu te ofereci), tentava de algum jeito ligar essa trava para ser normal, mas não consegui e falei a minha amiga que está em São Francisco e não vai me abraçar, eu precisava mais do abraço dela do que de você e isso não vai acontecer, nada vai acontecer. Falei a ela que odeio que essa trava tenha destravado, que eu tenha sido tão exposta, não odeio porque não deu certo, odeio porque não sou assim e nunca quis ser. A trava faz parte de mim. Sempre fez. 
O que me dói, dentre tudo que está ardendo, é que fui obrigada a assumir em seu lugar que você não me queria. Não bastou você não me querer, eu tive que mostrar isso a nós dois. Você é muito ridículo. 
O que também dói é que, exatamente por ter sido tão sincera, não tenho mais nada para fazer, não posso ir atrás de você porque já fiz tudo, absolutamente tudo que poderia ser feito. A gente sabe que tudo é pouco, a gente sabe, sim. Mas eu me deslocar atrás de você seria me odiar, seria não me respeitar e é difícil não ir porque eu queria, sim, te prender aqui, mas isso não funcionaria e tenho que ficar lendo o que escrevi, toda hora, em minha própria parede: "Não vá!" Alguém tem que ficar. Alguém eu.
Seu presente chegou ontem, depois de um mês e meio. E não sei o que farei exatamente porque adoraria ficar para mim, mas odiaria te lembrar toda hora, porém, já te lembro toda hora sem precisar olhar para nada. Vai ser ruim continuar o seriado que fiz você começar a ver porque vou saber que você é o único que conheço que também vê e não vou poder comentar. E não é porque te bloqueei em todos os locais possíveis de se bloquear, se eu não tivesse feito isso, ainda assim, não poderia porque basta de humilhação. 
Sou três anos mais velha que você, tenho uma lista de relacionamentos sérios porque, estranhamente, ninguém consegue se relacionar comigo rindo. E eu quis me relacionar com você rindo, não sendo séria, mas você perguntou "vamos ficar sério?", disse que não ia se sentir bem se eu estivesse, também, com outras pessoas. E eu aceitei. E você foi embora. 
E eu fiquei. 
E você foi embora. 
E eu tive que pegar na sua mão para você ir embora porque você, perturbadoramente, não estava conseguindo ir sem minha ajuda e isso me quebra mais do que eu poderia ser quebrada porque eu não gosto de sentir pena de alguém, mas ver que alguém sente de mim é a queda do hálux. 
Você leu um inferno de um texto meu ontem e disse que sou triste com você, que não quer isso para mim. Disse isso como eu dizia às pessoas que eu estava deixando querendo reverter o jogo e sair com cara de quem se machucou, mas no fundo eu não sentia nada. Você faz cara de machucado, mas sabe, e sabe que sei, que você não sente nada. E sentir isso me desola, me derruba do prédio sem que eu queira cair. Se você não gosta de mim, se você apenas não me queria, por que me comprou? 
O que você veio fazer aqui? 
Nunca quis que alguém ficasse lendo meus textos em tempo real porque é agonizante deixar a alma na mesa de alguém para ela ficar olhando com uma lupa. Eu gosto tanto de você e de todas as suas piadas. Do seu cheiro de sabonete ou perfume do meu ex. Eu sou apaixonada pelo fato de você não gostar de mim e como vou sair dessa paixão se você nunca vai parar de não gostar? 
Eu não quero que você leia isso e fui obrigada a trancar o blog. E trancar o twitter e te bloquear por lá e pelo whatsapp e bloquear, também, o número da sua mãe. E o instagram. Da última vez, você tinha tudo isso e não apareceu. Dessa vez, você não tem nada disso e não vai aparecer, mas não porque não tem. Você poderia ligar, mandar um e-mail ou bater em minha porta, mas não vai porque não quer. 
Porque não quer e nunca quis. 
E amo o fato de você não me querer porque todo mundo sempre quis. Todo mundo sempre me quis porque sempre fui igual a você e, provavelmente, por isso te quero tanto. Jenifer vai sangrar pelos olhos de tanta mensagem enorme de dor que vou mandar. "Socorro, não estou aguentando." "Definitivamente, não vou aguentar". Porém quero conseguir, pelo menos dessa vez, não expor minha dor a Deus e ao universo, só para ela já está bom. Bom porque já é mais que ruim. Bom porque todos os meus amigos disseram que eu iria me lascar fazendo o que fiz, mostrando o que eu poderia ser. Todos mandaram eu sair dessa. 
Inclusive ela. 
Mas ela é a mesma que sempre diz para eu nunca desistir. Nem quando eu morava no inferno. Ela, naquele tempo, foi a única que disse que a hora certa de desistir aparece. Que desistir dói demais. Que desistir do que quer é desistir de uma parte de si. Então é ela que vai ficar na Califórnia e não aqui para me abraçar enquanto tô toda mastigada por seus dentes caninos bem pronunciados. Ainda tem meu livro que está aí e não quero que fique aí porque foi um presente meu para mim. E isso tem importância sobrenatural. E só queria ser abraçada pelos próximos dias, semanas ou meses em que isso vai me perturbar em que vou ficar esperando você aparecer e rezando, ao mesmo tempo, para que não apareça sem intenção de aparecer. 

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