Hipopneia

O meu medo de ser disponível realmente me torna indisponível e me joga a uma distância tão macabra que assusta quem assiste e me faz esquecer que estou longe. Todas as vezes que forço uma psicologia reversa situacional, acabo esquecendo que estou me sabotando e esqueço das pessoas que enfio nisso aos murros, o fingimento se transforma numa realidade porque eu levo meu teatro tão a sério que ele deixa de ser teatro. Amarro algumas pessoas em minha vida pelo simples fato de fingir que não estou amarrando, finjo tão bem que uma hora passa a ser verdade. 
A última sabotagem, e aprendi a usar essa palavra porque uma amiga me fez ver o quanto eu a usava com meu próprio ser, foi trocar seis por meia dúzia ou por sete ou por cinco, quem pode dizer? Estava minha cabeça muito surtando porque a atenção desejada não estava sendo devidamente enviada, apesar de que, quando vinha, vinha com "P.S: eu não tenho como te dar atenção se você não me der atenção" e, bem, eu teria que lidar com alguém igual a mim? Como? Mas não foi isso que eu sempre quis? Não foi isso que sempre senti falta nos outros? Eu mesma? Sei lá, talvez não. Não soube segurar, não soube dar assistência. Pelo contrário, atendi quem tinha feito o alarme da minha casa soar sem freios por noites e tardes. Estava alguém me dando atenção, respondi com atenção. Como se eu precisasse, sempre, de uma resposta antes de conseguir pronunciar a pergunta. 
Não quero andar em círculos e voltar para a pessoa que sempre volto quando tudo dá errado porque, se olharmos mais de perto ou se dermos alguns passos para trás e enxergamos o quadro completo, não há nada errado. Talvez eu nunca me sinta certa porque isso é a vida gritando. A vida deve gritar que eu estou errada para que eu não estacione. Por que eu andaria para frente se tudo estivesse apenas certo? Para procurar um erro? Na verdade, é isso que eu faço: sou uma caçadora de erros, de pessoas erradas e perturbadas. E a vida sabe, mas às vezes quem esquece sou eu.
Não quero ter que olhar de novo para você e dizer com todas as letras que "olha, não é você que eu amo" porque, apesar de, dessa vez, eu não amar ninguém, isso não é justo. Não que eu pregue a justiça. Não que ela exista. Não que você me ame. Não que você mereça meu melhor. Não que alguém mereça o meu melhor. E não que eu tenha um.
Não quero ouvir você inventando que quer casar comigo e que está apaixonado por mim desde o dia que precisei fazer você me convencer a ficar naquele local que nem sei mais onde é, mas que o chão era de terra, e ainda deve ser, e quero muito menos descobrir que isso pode ser verdade porque, caso seja, ninguém nunca antes gostou de mim por três anos e meio ou, pelo menos, nunca deixou que eu soubesse. E descobrir isso seria assustador.
Não quero ferrar com sua cabeça e fazer você chamar outras pessoas pelo meu nome. Não quero aparecer como um fantasma fazendo caminhada na avenida cinco horas da manhã, na avenida onde você estaria saindo de uma festa. Não quero que você ache que eu sou a pessoa mais leal que alguém poderia achar porque, apesar de odiar, talvez eu realmente seja. E eu nunca quis nada disso, mas fiz e nunca te pedi desculpas porque isso seria um pedido mais por minha causa que pela sua e jamais faria isso contigo.
Fiz algumas coisas erradas ultimamente porque achei que podia ser errante depois de tanto tempo sendo tão certa, mas eu não consigo não importar quem quer que seja e nem sei se quero mudar isso. Importo tudo que passa, mas ainda bem, tem gente que não consegue importar mais nada. Não queria andar para trás e precisar de alguém que deveria ser apenas passado. Um passado que eu não soube segurar porque apenas não cabia em minha mão e a gente sabe que, por mais que doa ou que apenas tenha doído em você, sei lá, nem sei se quero saber, a gente sabe que a culpa não é minha. Não consigo andar para frente hoje e é por isso que preciso, mais uma vez, de quem nunca foi embora porque eu nunca abri a porta. Eu preciso, infelizmente, de você agora. Preciso novamente pelo mesmo motivo: por não ser você.
Por não ser você que aterroriza meus sonhos, e as manhãs que acordo. Por não ser a sua ausência que eu sinto quando tem 93 pessoas conversando, ao mesmo tempo, comigo numa noite. Por não ser para você que eu tenha que fingir que eu tô segurando a situação, mas que, na verdade, ela já caiu e quebrou sobre e junto com meus pés. Por não ser para você que eu fui idiota por cinco minutos e mostrei minha verdadeira cara fofinha e totalmente diabética. Por não ser para você que eu não consiga dizer "não". Por não ser você que, quando eu forço uma ausência esperando os alarmes que tanto eram tocados, me responda com uma lanterna de um celular barato que diz apenas "eu estou vivo". Por não ser para você que eu implore, em silêncio, em meio ao choro que não mostro, que me ferre logo de uma vez daquelas ferradas que me façam tremer com a raiva da decepção, mas que me faça parar de achar que posso tirar o pé do chão. Por não ser de você o que eu desejo saber o que a cabeça está pensando todos os segundos de todos os dias. Por não ser por sua causa que eu ache que todas as roupas são horrorosas apesar de saber que são lindas para o resto do universo e apenas porque eu não me sinto suficiente, mas não é por sua causa. Não é sua ausência que me incomoda mesmo que ainda haja presença, mesmo que eu não tenha sido (ainda?) deixada. Não é seu espírito que me diz que não vai ficar mesmo quando a voz diz que quer. Não é você que, de repente, se voltasse a soar todos os alarmes de todas as minhas casas ia me expulsar ou me fazer, pela primeira vez na vida, ficar de verdade. Por não ser você que, apesar de eu estar precisando, seja o destinatário dessas palavras horrorosas, porque, claramente, o texto nem é para você. Por não ser você que, mesmo que eu saiba, em alguma mitocôndria, vai ser um completo idiota em meu mundo dentro de alguns dias, semanas ou meses e, mesmo sabendo, penso que esse dia jamais vai chegar porque toda loucura ignora ser passada. Por não ser você que me tem fácil demais e não é capaz. Porque você apenas não me tem, é por isso que eu preciso.


Comentários