Fragmentação agregada

Tentei afastar sua mão do meu cabelo meio escondido, meio publicamente, para tentar gritar em silêncio que ninguém me machuca mais, não. Não este ano. De uma forma que ultrapassa a frustração humana, eu estou quebrada em oitenta milhões de pedaços espalhados pela galáxia.
Eu sento para pensar em como a vida corre e ela voa, quando eu levanto, me arrependo do tempo (tempão) que perdi pensando. E me arrependo de dormir e de viver. Porque viver é uma danada perda de tempo. Porque a gente vive na intenção de um dia viver. Porque viver não é estudar. Viver não é trabalhar. Ficar de férias não é viver. Final de semana com álcool não é viver. Nem sem álcool. E é uma angústia tão grande por não ser nada aos vinte. Quase vinte e um. Uma angústia torta e meio maior por já ter feito muita coisa porque eu penso "eu podia ter feito tudo devagar, até hoje teriam coisas novas e radicais". Podia estar, hoje, completa, se tivesse feito menos e dado lugar a outras coisas. Mas é tudo uma loucura que só faz barulho. Como eu estaria aqui sabendo tanto que não sei nada se eu soubesse menos? 
Tenho medo de janeiro, admito. Fico querendo fechar os olhos e pular para fevereiro, mas o último fevereiro foi ruim para todos que estavam perto de mim e se a gente pular pra março, são mais de 60 dias sem viver. Mesmo que eu não saiba o que é viver. O que não significa, no entanto, que eu não possa amar a vida.
Respeito em todas as direções esse milagre que ninguém explica tão bem. Respeito a forma que ela me ensina a ser, no mesmo passo, humilde e cínica. Sou doente de cinismo e não me envergonho disso, obviamente isso atinge, vez ou outra, quem não tem nada a ver, mas a vida também é chuva. 
Ninguém vai acreditar que apesar de todos os estômagos vomitados esse ano, consigo ser eu mesma, sem medo de comer açúcar sem freios, sem medo de não usar máscaras na luz solar incandescente. Eu não sei se o contrato assinado me leva futuramente a mais um abismo. Mas em nenhuma das quedas anteriores eu pude prever. E se for cair, que aproveitemos cada passo enquanto as pernas estão firmes.
A tentativa de distanciar sua mão fracassou na metade porque no mesmo espaço-tempo em que a vida me transformou em poeira, você é a única pessoa, em vinte anos, que fez (e faz) eu me sentir o diamante mais duro e mais caro já existente, o que, automaticamente, não te deixa ser menos que isso.


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