O tempo vai e o vento vem

Eu não queria. Fingia querer, batendo o pé no chão, pichando nos muros que aquilo era meu ar. Aquilo não de objeto. Aquilo de alguém. Aquilo daquela segunda-feira quente de maio em que eu morri várias vezes numa só tarde e outras tantas na mesma manhã. Antes de sair da minha casa à sua. Antes de te ligar. Antes de ouvir o seu "não apareça por aqui". Antes de decidir que eu iria mesmo com um não. Antes disso, eu acordei morrendo. Uma correção: eu não batia o pé, não. Apesar de todo o espetáculo sobre a falta que eu sentia dentro e ao redor de mim, ainda andava com um minúsculo lembrete de que não ia dar. De que não era para ser. E morri naquela noite também. Odeio chorar. Não por parecer criança. Porque pareço uma criança em outros cinquenta âmbitos. Mas porque minha cabeça não aguenta. Minha cabeça não foi adaptada para chorar. Quando passa de três minutos, já quer pular do meu pescoço. Mas naquele dia quente e desagradável, não consegui chorar por menos de três. Por menos de três horas. Queria escrever sobre alguma coisa e por isso escrevi de novo sobre isso. Não sei escrever como é estar bem. É um pouco superior demais para caber em palavras. Sim, um pouco demais. Agora eu não preciso ouvir que sou chata. Nem que sou fria. Nem um "por favor, segure na minha mão" ou "seja mais ciumenta" ou "seja mais carinhosa" ou qualquer coisa que espere de mim o que não existe. Porque eu sou legal. Ou achei quem goste finalmente da minha chatice sem limites. Ou vai ver eu nunca fui chata, só bati em algumas portas erradas. Ou qualquer outra coisa que explique por aí. Porque eu não sou fria. Não que eu seja quente. Ou talvez eu seja. Reação orgânica a quente. Talvez. E segurar na mão sem nem sentir que o fiz. E sentir o ciúme monstruoso que eu sempre senti. Desde que lembro ser eu mesma. Tipo na quarta série, quando eu queria minha melhor amiga só para mim, mas tinha que entender que o mundo não era só meu. Pronto, me tratei. Quer dizer, minha doença eram pessoas não saudáveis. Escrevi sobre isso só pra lembrar que não quero nada que me faz mal, não. A gente não pode pedir pelos sentimentos alheios e eu devia ter entendido isso todas as vezes em que eu ouvi pedidos: Que eu só estava no lugar errado. Mas tudo bem se eu notei tarde. Tudo bem porque eu diferenciei os locais errados estando no certo. E o certo também não me assusta mais. Porque o local certo, antes de ser externo é interno. Sou eu. E eu não vou me abandonar.



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