Perecível

Você estava falando sobre se sentir completo. Sobre querer se sentir completo. Lembrei que eu acho que nunca nos sentiremos assim. Na terceira pessoa do plural que inclui a humanidade, não na que inclui a gente. Não acho que muitas coisas incluam apenas a gente. Nem poucas.
Lembrei, em seguida, de uma aula que me ensinaram que somos uma circunferência sem um arco. E sempre teremos a ausência deste arco porque é isso que nos faz viver: o impulso de buscar um complemento. Quando achamos um arco, outro se perde. E dá-se o ciclo maravilhoso (ou horrível) da vida. Completos estaremos sem pulso, e fim. 
Depois notei, no meio de todo seu lerelê, que me sinto bem por te ouvir por horas e horas no meio de um sono que poderia estar acontecendo. Doo minhas horas a quem aparenta precisar delas mais que eu mesma e me sinto bem quando alguém se sente melhor, mesmo que em um milímetro, por algo que eu fiz. Concluo, desta forma batida, que o que mais me faz bem é deixar alguém bem. Se notarmos, o que eu faço pelos outros é, em primeira instância, mesmo que pareça ser em segunda, por mim. Então, se diga, o que você faz por si? 
Nós dois é algo que não existe ou que não deveria existir tão cedo. Se bem que não é cedo. Na verdade, mesmo, só não quero ser seu par. Estou bem sendo ímpar. Quer dizer, faz tempo que não me sinto bem por não ter alguém. Mas o alguém era específico. O alguém não era você. E se você notar o "era", notará, claro, que "era" não é "é". Que bom. Aliás, que muito bom. 
Pois bem, eu não gosto de você quando você não está por perto. Que ótimo, assim não preciso te telefonar. Tenho uma preguiça substancial em aparecer nos nossos encontros. Que bom, assim não marco nenhum. Mas que ruim que eu não esteja interessada, isso faz você se interessar ainda mais, não é? Humano é um bicho doente. E não fugimos disso. Na terceira pessoa do "nós dois" e não da humanidade porque seria redundante. Eu não quero te ver várias vezes por semana, nem queria que você quisesse. Os nossos desejos são verdadeiras facas. Estou aqui para provar. 
Viva e nervosa. 
Viva por estar bem. Estou bem de novo. Mil vezes eu fico bem e dez eu fico mal. Que bom. Aliás, que muito bom! Adoro seu rosto de bebê e sua barba fofa que é a segunda no mundo que eu gostei. Sinta-se feliz, por favor! Eu não desejava você tanto assim. Era só sua cara que era linda. Ainda é. O era aqui é um é. 
E me sinto nervosa porque eu não quero te machucar. Por tudo que você achar que seja sagrado, não se machuque em minhas mãos.


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