Pílula Azul

Primeiro, eu tinha duas opções: arriscar ou dormir. Arrisquei para variar (para viver mais, na verdade.). Achei que seria normal como sempre foi. Não pensei que, como dizem as revistas, eu teria uma crise assim que acabasse, mas tive, só que, como, graças a Deus, eu sou eu, a crise foi silenciosa, rápida e imperceptível. Entretanto, durou o bastante para eu analisar o tipo de pessoa que eu sou. Sabe aquela pessoa que, pelo menos algum dia, você já ouviu falar como a mais desclassificada para o que quer que seja? Foi assim que eu me senti naqueles dois, três ou cinco minutos de crise. Eu era igual a qualquer estranha que passa na rua, mas que é conhecida porque cuspiu no prato que comeu (por exemplo). Ninguém conhece ela, ninguém sabe nem qual foi a comida, mas todos acham terrível o fato dela ter cuspido. Eu era ela naqueles poucos minutos. Aí eu chorei em silêncio e me senti uma criança. Só que, como, graças a Deus, eu sou eu, bastou um movimento do meu corpo para que a garganta destravasse a as lágrimas parassem de cair. Que explodisse o mundo! Algumas horas depois, eu só pude confirmar que esse maldito globo só pode girar em torno de mim: seria impossível que esse assunto me perseguisse de esquina em esquina. Seria impossível que em todos os lugares todas as pessoas ouvissem meus pensamentos relacionados ao meu fracasso, mas eu não pude mandar ninguém parar, não pude pedir para ver a câmera, nem os bastidores, nem a pílula vermelha... Eu não pude. Eu nunca posso.


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