E até o céu morrerá


Vez por outra, como algumas estações do ano, em lugares onde elas não são tão determinadas, como onde moramos, mas sabemos que elas existem, seus sentimentos escorriam pelo ralo como as células mortas do dia-a-dia. O que podia ela fazer? Não há tendências humanas a reter água usada. Tentava, então, não observar para se incomodar menos, porque era isso do quase nada que ficava: o incômodo de ver-se esvaziando e nada poder fazer. Incomodava-se também nos cinco ou seis dias de semana que deixava seus vícios serem suas pernas. "Deixava". Sentido, foco, direção, portas, luzes... Tudo era nada. Amor, afeto, caridade, atenção, esforço... O nada transformava-se em tudo, em tudo que ela tinha para acordar. Até o próprio corpo e a mente entravam no automático. Sabe-se lá em que mundos ela residia nessas estações. Certeza nenhuma de que ela voltaria mais uma vez. A única meia absoluta - meia! - era que se ela voltasse seria outra. Outra de novo. Das mil em uma, em quatro, de vez em quando, sem determinação, que ela já tinha sido. Mas outra para ela apenas, é claro. Quem raios de fora iria notar tantas viagens, mortes, mundos e vidas em uma pessoa só?