Dirigido por Joaquim
Pedro de Andrade, o filme Macunaíma (1969) reune de uma forma espetacular os
métodos do diretor, que se resume em suas próprias palavras: "Só sei fazer cinema no Brasil, só sei
falar de Brasil, só me interessa o Brasil", os moldes do Cinema Novo
Brasileiro, por ter sido feito na época desse movimento, e as características
do Modernismo, movimento cultural da década de 1920, já que é baseado no livro
de mesmo nome de Mário de Andrade.
Seu
interesse de representar o Brasil em suas obras aparece nitidamente no filme
quando, por exemplo, mostra o protagonista dotado de preguiça e mau-caráter, características que serão
notadas por qualquer um que assista ao filme.
Outra
representação nacional marcante apresentada no filme é a questão do preconceito
racial, pois pode-se interpretar que Macunaíma só passa a se dar bem quando
torna-se branco. Elementos como esses apresentados no clássico de Joaquim Pedro
de Andrade são até hoje vistos pelo país o que parece garantir uma certa
imortalidade da obra.
Além
de expor características do cidadão brasileiro, o diretor mostra também
prostitutas, milionários sem caráter, policiais e vários tipos de personagens
que passam pela vida de Macunaíma e representam a realidade diária, mesmo que
de uma forma cômica, e até mesmo irônica, do dia-a-dia da nação.
A
obra do autor tornou-se um tipo de linguagem para expressar o quadro do país
tanto em relação aos problemas vividos até hoje como nas características da
maioria dos brasileiros.
Cinema
Novo e Modernismo
Há
uma característica em comum entre os dois movimentos em que o filme está
inserido: ambos foram reações contra o código dominante.
O modernismo, contra o parnasianismo e seu método rigoroso de tratar a
linguagem. O cinema novo contra a seriedade dos filmes produzidos em São Paulo.
Assim, a obra não poderia ser nada menos que uma comédia, e dos melhores tipos
por conter ironia e uma pitada de humor negro.
Mesmo que os contextos da realidade do país da década de 1969 não fossem os mesmos da de 1920 e alguns
quadros dos filmes não tivessem como ser os mesmos dos livros justamente pelo
contexto diferenciado e pela mente do diretor que encontrava-se em outro
período da mente de Mário de Andrade, o fato do cinema novo ir contra a
seriedade dos filmes anteriores associa-se ao do modernismo indo contra a
seriedade do parnasianismo e garante assim uma fidelidade do filme ao livro
tanto em aspectos mitológicos e de costumes, como nas representações, nos
cenários e nas passagens.
Um Herói Preguiçoso
Quanto ao personagem principal, seu nome não poderia ser outro.
Macunaíma (maku, que significa mau; ima, que significa grande). Ele é um herói
diferente de todos os outros: mesmo que tenha coragem, é covarde e mesmo que
tenha capacidade, é inepto. Mas há ainda um tipo de magia misturada à
malandragem que o ajuda a se dar bem, o que o diferencia dos demais
personagens.
Macunaíma é a representação de brasileiros luxuriosos, preguiçosos e
sonhadores que vai na direção oposta do mito do “bom-selvagem” idealizado por
José de Alencar e outros escritores romancistas.
Realizando uma comparação com outro herói típico, o Peri, de “O
Guarani”, obra de José de Alencar, vemos a idealização do brasileiro. Na obra
de Alencar, o nativo está caracterizado tipicamente como um herói europeu dos
séculos românticos, só faltando em si a armadura brilhante e o título de
nobreza. O herói de Andrade aparece como atualmente vemos o mito do baiano: o
homem preguiçoso que espera que tudo aconteça e caia aos seus pés, mas com
sorte o suficiente para que realmente aconteçam.
Outros elementos que conferem caráter heróico ao personagem principal,
são seus encontros com seres lendários do folclore brasileiro que pode ser
visto, por exemplo, no seu relacionamento com a Mãe da Mata, seu encontro com o
Curupira, e em sua morte, na última cena.
A Obra
Algumas partes do filme não são explicadas e fogem da realidade, como,
por exemplo, sua tranformação de negro para branco. É onde o filme deixa de
representar apenas a realidade urbana e mostra o lado lendário do país.
Macunaíma é uma obra que representa, mesmo que de forma abstrata e
brusca, cômica e irônica, mas ainda assim compatível, a realidade do Brasil e
dos brasileiros.
Pode
ser considerada uma obra épica, com narrador e enredo clássico, uma vez que
existe a narração por parte do protagonista
e dos elementos dramáticos e mágicos presente constantemente na obra. O
surrealismo também se apresenta constantemente no enredo.